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O Livro do Profeta Habacuque: Uma Reflexão Teológica e Missiológica Sobre a Fé em Tempos de Crises

  O LIVRO DO PROFETA HABACUQUE: UMA REFLEXÃO TEOLÓGICA E MISSIOLÓGICA SOBRE A FÉ EM TEMPOS DE CRISE Dr. Gustavo Maders de Oliveira Bacharel em Teologia (Faculdade Teológica Charisma) Mestre e Doutor em Missiologia (Faculdade Teológica e Cultural da Bahia) Resumo O livro do profeta Habacuque apresenta uma das mais profundas expressões de fé em meio à crise e à injustiça social no contexto do Antigo Testamento. Diferente de outros profetas que falam em nome de Deus ao povo, Habacuque fala a Deus sobre o povo, levantando questionamentos teológicos e éticos sobre o sofrimento humano e a aparente inércia divina diante do mal. Este artigo tem como objetivo analisar o conteúdo teológico e missiológico do livro, destacando o diálogo entre o profeta e Deus, a pedagogia divina no sofrimento e a centralidade da fé como resposta existencial do justo. Palavras-chave: Habacuque; Profecia; Fé; Teologia Bíblica; Missiologia. 1. Introdução O livro de Habacuque situa-se em um ...

Tetélestai (Está Consumado)

 

"ESTÁ CONSUMADO!” (TETÉLESTAI): UMA ANÁLISE TEOLÓGICA E SISTEMÁTICA DO BRADO DE CRISTO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O CRENTE E PARA A IGREJA


Dr. Gustavo Maders de Oliveira

Bacharel em Teologia (Faculdade Teológica Charisma)
Mestre e Doutor em Missiologia (Faculdade Teológica e Cultural da Bahia)

Resumo

O brado de Jesus em João 19:30, tetélestai (“está consumado”), representa o clímax da obra redentora de Cristo e sintetiza a consumação histórica e teológica do plano de salvação divino. Este artigo propõe uma análise teológica e sistemática do significado dessa declaração, examinando seu contexto bíblico, semântico e soteriológico, bem como suas implicações eclesiológicas e escatológicas. A partir de uma abordagem exegética e sistemática, demonstra-se que o brado não expressa mera conclusão existencial, mas a plena realização da reconciliação entre Deus e a humanidade. A pesquisa conclui que a obra consumada fundamenta tanto a segurança da salvação individual quanto a identidade e missão da Igreja.

Palavras-chave: Tetélestai; Soteriologia; Eclesiologia; Escatologia; João 19:30; Obra de Cristo.

1. Introdução

Entre as sete palavras proferidas por Jesus na cruz, o brado “está consumado!” (Jo 19:30) apresenta-se como uma das declarações mais densas do ponto de vista teológico e redentivo. Não se trata de um lamento de morte, mas de uma proclamação de vitória, por meio da qual Cristo atesta a consumação do plano divino de salvação.

Do ponto de vista histórico-redentivo, esse brado insere-se como o clímax do historia salutis, representando não apenas o término do sofrimento de Cristo, mas a culminância da economia salvífica prometida desde Gênesis 3:15 e progressivamente revelada na história de Israel. Para a Teologia Sistemática, a expressão carrega implicações centrais para a Soteriologia, a Eclesiologia e a Escatologia, tornando-se basilar para compreender a segurança do crente e a missão da Igreja no mundo.

2. O Termo Tetélestai e Seu Contexto

A expressão grega tetélestai é a forma perfeita do verbo teleó, que significa “completar”, “levar à perfeição”, “cumprir plenamente”. O tempo perfeito indica uma ação consumada com efeitos permanentes, isto é, uma obra cuja validade se perpetua.

No contexto cultural, a palavra possuía usos distintos:

a) em contextos religiosos judaicos, remetia ao cumprimento da Lei e dos profetas (cf. Mt 5:17);
b) em documentos comerciais greco-romanos, era utilizada para indicar que uma dívida fora “paga por completo” (paid in full)⁴.

Ambos os usos encontram-se em João 19:30: Cristo cumpre a Lei (Rm 10:4) e quita, de forma definitiva, a dívida do pecado (Cl 2:14).

3. Dimensão Soteriológica: A Obra Substitutiva e Definitiva

Para o indivíduo crente, a consumação proclamada por Cristo implica, primeiramente, a plenitude da expiação. Cristo, como Cordeiro substitutivo, oferece-se uma vez por todas (Hb 10:10-14), abolindo a necessidade dos sacrifícios cerimoniais e inaugurando um novo e vivo caminho (Hb 10:19-20).

Conforme Calvino, “ao pronunciar tetélestai, Cristo não apenas declarou o fim de seu sofrimento, mas a plena satisfação da justiça divina, de modo que nada resta a ser acrescentado para a nossa salvação”⁵. Assim, três consequências soteriológicas centrais podem ser delineadas:

  1. Justificação objetiva: O crente é declarado justo com base na obra vicária de Cristo (Rm 3:24-26).

  2. Reconciliação definitiva com Deus: A barreira do pecado é removida (Ef 2:14-16).

  3. Segurança eterna da salvação: Sendo obra consumada, não há mérito humano que a complemente (Jo 10:28-29).

Essa realidade fundamenta a vida devocional e a confiança existencial do cristão, libertando-o da tentativa meritória de obter salvação por obras.

4. Dimensão Eclesiológica: Fundamento e Missão da Igreja

No âmbito eclesial, a obra consumada serve como pedra angular para a própria constituição e missão da Igreja. A comunidade cristã não nasce de um pacto humano, mas do sangue derramado por Cristo (At 20:28). Quatro aspectos podem ser destacados:

  1. Fundamento ontológico da Igreja: A cruz é o ponto de origem e sustentação da comunidade dos redimidos (Ef 1:22-23).

  2. Unidade do Corpo de Cristo: A morte de Jesus unifica judeus e gentios, derrubando toda hostilidade (Ef 2:14-16).

  3. Missão reconciliadora: A Igreja existe para proclamar que a obra salvífica é plena e acessível (2Co 5:18-20).

  4. Memória sacramental: Cada celebração da Ceia do Senhor proclama e atualiza a verdade de que “está consumado” (1Co 11:26).

A vida eclesial, portanto, é marcada pela consciência de que toda a sua existência deriva de uma obra já perfeita e eficaz.

5. Dimensão Escatológica: A Consumação Final

O brado, embora declare a consumação histórica da redenção, projeta a esperança escatológica. O Reino de Deus foi inaugurado, mas aguarda sua plenitude (Ap 21:1-5). Como afirma Wright, “a cruz e a ressurreição constituem a aurora do novo mundo de Deus, mas ainda vivemos na tensão entre o já e o ainda não”⁶.

A Igreja e cada crente, amparados pela obra consumada, vivem em esperança ativa, aguardando a consumação final, quando Cristo submeterá todas as coisas e Deus será “tudo em todos” (1Co 15:28).

6. Conclusão

O brado “está consumado” não é um suspiro de derrota, mas a proclamação de vitória cósmica e eterna. Para o crente, significa segurança, reconciliação e liberdade da tentativa meritória de salvação. Para a Igreja, constitui o alicerce de sua identidade e a motivação de sua missão reconciliadora no mundo.

Ao ecoar essa declaração, a Igreja anuncia que a redenção não é promessa futura incerta, mas realidade presente, cuja plenitude se manifestará escatologicamente. A obra é, de fato, consumada; resta-nos vivê-la e proclamá-la.

Referências

BROWN, Colin. The New International Dictionary of New Testament Theology. Vol. 3. Grand Rapids: Zondervan, 1986.
CALVINO, João. Comentário do Evangelho de João. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2014.
GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999.
STOTT, John. A Cruz de Cristo. São Paulo: ABU Editora, 2010.
WRIGHT, N. T. Surpreendido pela Esperança. São Paulo: Thomas Nelson Brasil, 2018.


24/07/2025












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