A EXEGESE DE MATEUS 24: ENTRE O JÁ E O AINDA NÃO DA PROFECIA ESCATOLÓGICA
Dr.
Gustavo Maders de Oliveira
Bacharel
em Teologia; Mestre e Doutor em Missiologia (Cursos Livres)
RESUMO
Este artigo propõe uma análise exegética, teológica e escatológica de Mateus 24, conhecido como o “Discurso do Monte das Oliveiras”. O texto combina elementos de profecias cumpridas, especialmente a destruição do Templo de Jerusalém em 70 d.C., com profecias escatológicas ainda por se cumprir, como a segunda vinda de Cristo. Por meio de uma abordagem histórico-gramatical e literária, busca-se compreender o significado do texto original e sua aplicação para a fé cristã contemporânea. O estudo inclui um quadro cronológico que distingue os eventos passados, presentes e futuros, conforme revelados por Cristo neste discurso.
Palavras-chave: Mateus 24; Escatologia; Exegese; Segunda vinda; Destruição do Templo; Teologia bíblica.
1. INTRODUÇÃO
O capítulo 24 do Evangelho segundo Mateus é um dos textos mais relevantes e controversos do Novo Testamento no que diz respeito à escatologia. Inserido no contexto do ministério final de Jesus em Jerusalém, este discurso profético responde às indagações dos discípulos quanto ao futuro do Templo e ao fim dos tempos. Ao analisar Mateus 24, deve-se atentar tanto ao seu contexto imediato quanto ao seu paralelo nos evangelhos sinóticos (Mc 13; Lc 21). A linguagem figurada, típica do gênero apocalíptico, impõe o desafio de interpretar corretamente os elementos que apontam para eventos históricos e os que antecipam o juízo escatológico.
2. CONTEXTO HISTÓRICO E LITERÁRIO
O discurso profético de Mateus 24 ocorre logo após o capítulo 23, onde Jesus denuncia os líderes religiosos de Israel e profetiza a desolação do Templo. O contexto histórico aponta para a tensão crescente entre o império romano e os judeus, culminando na destruição do Templo em 70 d.C. (JOSEFO, 2001). Literariamente, Mateus agrupa cinco grandes discursos de Jesus, e o de Mateus 24 é o último, preparando o leitor para a paixão e ressurreição.
3. EXEGESE DETALHADA
3.1. Mateus 24.1–2: A profecia da destruição do Templo
Jesus profetiza que “não ficará aqui pedra sobre pedra” (v. 2), antecipando a destruição literal do Templo em 70 d.C. A linguagem é clara e literal, mas também simbólica da substituição da Antiga Aliança pela Nova Aliança em Cristo (cf. Hb 8.13).
3.2. Mateus 24.3: Três perguntas escatológicas
Os discípulos fazem três perguntas:
Quando sucederão estas coisas?
Qual o sinal da tua vinda?
E do fim do mundo?
A resposta de Jesus não é linear, mas apresenta sobreposição de eventos locais (judáicos) e universais (escatológicos).
3.3. Mateus 24.4–14: Sinais preliminares e dores de parto
Jesus fala de guerras, fomes, terremotos e perseguições, mas afirma que isso ainda “não é o fim” (v. 6). Trata-se de uma escatologia inaugurada, indicando que o mundo experimentará convulsões até o fim. A perseverança dos santos (v. 13) e a pregação global do Evangelho (v. 14) são condições que antecedem o fim. Existe uma analogia dos eventos às dores de parto de uma mulher a dar à luz: cada vez mais frequente e cada vez mais intensa. Assim serão os sinais, continuamente aumentarão em intensidade e frequência.
3.4. Mateus 24.15–28: A grande tribulação
Jesus cita Daniel e o “abominável da desolação” (Dn 9.27), um evento já cumprido parcialmente com a profanação do Templo por Antíoco IV Epifânio e, depois, pelo general Tito em 70 d.C. Contudo, o texto parece apontar para uma repetição futura, possivelmente ligada ao Anticristo escatológico (2Ts 2.3–4).
3.5. Mateus 24.29–31: O retorno glorioso de Cristo
Aqui o texto salta para um evento de caráter universal e cósmico. A linguagem (“o sol escurecerá... o Filho do Homem virá nas nuvens”) remete a passagens de Daniel 7.13 e Isaías 13.10. Os anjos reunirão os eleitos de toda a terra — uma referência inequívoca à segunda vinda de Cristo.
3.6. Mateus 24.32–35: A parábola da figueira
A figueira simboliza os sinais que anunciam a proximidade da vinda. A geração mencionada no v. 34 pode ser entendida como a geração contemporânea de Jesus (referente à destruição do Templo) ou a geração escatológica que verá os últimos sinais.
3.7. Mateus 24.36–51: Vigilância e fidelidade
Jesus ensina que ninguém sabe o dia nem a hora (v. 36), nem mesmo os anjos. Compara sua vinda aos dias de Noé, nos quais a maioria estava desatenta. A ênfase é na vigilância, mordomia e fidelidade, não em calcular datas.
4. QUADRO CRONOLÓGICO DOS EVENTOS DE MATEUS 24
Evento Profetizado |
Cumprimento Histórico |
Cumprimento Futuro |
Referência |
---|---|---|---|
Destruição do Templo |
70 d.C. (Tito) |
— |
Mt 24.2 |
Falsos cristos e guerras |
Desde o 1º século até hoje |
Continuará |
Mt 24.5–6 |
Fome, terremotos e pestes |
Constantes na história humana |
Continuará |
Mt 24.7–8 |
Perseguição aos cristãos |
Desde a igreja primitiva |
Intensificará |
Mt 24.9 |
Pregação do evangelho ao mundo |
Em progresso |
Ainda em curso |
Mt 24.14 |
“Abominação da desolação” no Templo |
70 d.C. (Tito) |
Possível repetição futura |
Mt 24.15 |
Grande tribulação |
Jerusalém (70 d.C.)/fim dos tempos |
Clímax escatológico |
Mt 24.21 |
Sinais cósmicos |
— |
Escatológico |
Mt 24.29 |
Segunda vinda de Cristo |
— |
Futura |
Mt 24.30 |
Reunião dos eleitos |
— |
Futuro (arrebatamento?) |
Mt 24.31 |
Vigilância e juízo |
— |
Aplica-se até a consumação |
Mt 24.36–51 |
5. CONCLUSÃO
A exegese de Mateus 24 revela uma escatologia de tensão entre o “já” e o “ainda não”. Algumas profecias se cumpriram com a destruição do Templo em 70 d.C., outras apontam para a segunda vinda de Cristo. A mensagem não visa satisfazer curiosidades cronológicas, mas exortar à perseverança, santidade e prontidão diante do retorno iminente do Senhor. A fidelidade à missão, expressa na proclamação do evangelho a todas as nações, é a maior implicação prática desse texto para a Igreja contemporânea.
REFERÊNCIAS
BEALE, G. K. A New Testament Biblical Theology. Grand Rapids: Baker Academic, 2011.
CARSON, D. A. Expositor’s Bible Commentary: Matthew. Grand Rapids: Zondervan, 1995.
JOSEFO, Flávio. A Guerra dos Judeus. São Paulo: CPAD, 2001.
LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2001.
STOTT, John. A Mensagem do Sermão do Monte. São Paulo: ABU Editora, 1984.
WRIGHT, N. T. Surpreendido pela Esperança. São Paulo: Ultimato, 2008.
25/07/2025
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